EFEITOS DA CRISE E A MANUTENÇÃO DO EQUILIBRIO ECONOMICO-FINANCEIRO DOS CONTRATOS DE OBRAS PÚBLICAS

 

Gilmar Brunizio
Mestre em Direito Público pela UVA/RJ e
Sócio do Mendes & Brunizio Advogados Associados

As consequências econômicas e jurídicas da crise mundial instaurada pelos reflexos oriundos do COVID-19 serão relevantes na consecução das obras públicas.
Nesse momento, a sociedade vive num estado anômalo sem precedentes nas últimas décadas. Não se trata de um estado de exceção fundado numa crise econômica. As circunstâncias atuais são mais extensas, tendo em vista que afetam a locomoção das pessoas, impedindo a execução de algumas atividades. A sociedade está disposta a renunciar o seu direito de locomoção para garantir sua sobrevivência.

Quando a crise terminar, como estaremos? O que vamos fazer? Pois é, as obrigações contratuais podem ser suspensas, mas não estarão extintas automaticamente. Em algum momento, o empreiteiro deverá retornar suas atividades e cumprir com vossas obrigações.

O presente trabalho possui o objetivo de alertar àqueles que detêm contratos administrativos com a Administração Pública. A análise realizada se restringe aos aspectos econômicos e sancionador, com vistas a orientá-los como agir com boa-fé e solidariamente sem colocar em risco a sobrevida de vossas empresas.

Não obstante, todos terem sidos surpreendidos com o advento das drásticas consequências da crise econômica, o empreiteiro e o gestor público não podem dispensar o planejamento. Não tratamos aqui do planejamento já existente. Recomendamos que as partes realizem seus planejamentos futuros, de acordo com as possibilidades existentes.

A primeira questão a ser enfrentada é a escassez de recursos. Será que a Administração Pública conseguirá dar continuidade aos contratos administrativos em vigência? Os riscos são grandes, tendo em vista que as receitas reduzirão, por consequência, as despesas deverão seguir o mesmo caminho. O artigo 65 da LRF – Lei de Responsabilidade Fiscal – LC 101/00 – dispõe que nos casos de calamidade pública os empenhos poderão ser limitados. Esse planejamento caberá ao gestor público responsável que, de forma eficiente, comunicará aos seus contratados quais os contratos serão mantidos, suspensos ou rescindidos. Enfim, o gestor público não poderá se omitir e não tomar decisões específicas e adequadas relativamente as obras em andamento.

Outro ponto a ser enfrentado é a dificuldade na execução da prestação de serviços, sobretudo, a dificuldade de locomoção dos empregados e a previsível alta dos preços dos insumos, em decorrência da grave crise econômica que assolará o país. Essas dificuldades deverão ser consideradas pela Administração Pública, homenageando o princípio da solidariedade, uma vez que a vulnerabilidade das empreiteiras e de seus empregados são clarividentes no contexto atual. Será inadmissível que o Estado, de forma solidária, não seja razoável e eficiente para diminuir os prejuízos e os riscos causados pelos efeitos da crise na relação contratual administrativa.

A crise instaurada era imprevisível, logo, seria desproporcional a Administração Pública imputar os riscos da atividade ao particular contratado, uma vez que seus efeitos, certamente, acarretarão alterações contratuais ou até mesmo a sua extinção. A impossibilidade de continuidade na execução dos serviços ou o desequilíbrio econômico-financeiro da relação contratual possuem alto grau de causalidade com a pandemia, quer dizer, as razões são alheias as vontades das partes. Contudo, nesse momento é importante igualar os desiguais, pois o Estado possui e deverá proporcionar as condições de manter o equilíbrio outrora existente.

Várias consequências negativas que acarretarão aumento dos custos das obras públicas, destacando-se: (i) possível escassez de recursos nacionais ou importados; (ii) redução da capacidade laborativa, em virtude das dificuldades de locomoção; (iii) variação cambial.

Com amparo do princípio da solidariedade e da isonomia, os efeitos econômicos oriundos da crise, não podem ser enquadrados como caso fortuito ou de força maior, excetuando-se o fato do príncipe quando necessário ao bem coletivo.

Esses fatos se enquadram na Teoria da Imprevisão, pelas seguintes razões:

  1. A crise não era previsível, muito menos as propostas foram ofertadas considerando os vultuosos reflexos econômicos do momento.
  2. A competição ocorreu no ambiente de mercado daquele momento de normalidade;
  3. A crise de oferta e demanda para compras de insumos ocasionará alta de preços.

Enquadrando-se, os fatos na teoria da imprevisão, impõe-se a Administração Pública a adoção de providências, seja suspendendo ou extinguindo a relação contratual, quando verificada a inviabilidade econômica para execução dos serviços. Nesse ponto, frisa-se: o empreiteiro não está obrigado a executar um contrato que, de forma imprevisível, tornou-se inexequível. Não há proteção jurídica ao gestor público para impor a execução da obra para soluções futuras.

As alterações para continuidade dos serviços, seja imediata ou futura, deverá se basear nos comandos contidos no art. 65, inc. II, “d”, da Lei 8.666/1993 ou o art. 81, inc. VI, da Lei 13.303/2016 – no caso das estatais.

Por outro lado, o empreiteiro não poderá se locupletar da situação, executando os serviços para depois exigir da Administração a remuneração revisada. Ao contratado se impõe notificar a contratante de todas as variações que afetam a execução equilibrada do contrato, em obediência ao princípio da boa-fé e a lealdade na relação contratual.

Recomenda-se, portanto, que os empreiteiros elaborem relatórios demonstrando o status da obra – relatórios fotográficos, bem como, indiquem suas dificuldades para execução do contrato, estimem o período de prorrogação do contrato, quando possível, e indiquem, as variações de preços de mercado. Encaminhando, imediatamente, este instrumento à Administração Pública, com o desiderato de substanciar os gestores públicos da tomada de decisão de continuidade, suspensão ou extinção do contrato.

Por todo contexto, o presente trabalho é importante e todos os atos solidários deverão ser prioritários, mas a cautela com o futuro de sua empresa é primordial para sobrevivência dela.
Eis a contribuição para nossos parceiros e clientes.